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Como provar o assédio sexual no trabalho?

Recentemente, algumas notícias tomaram destaque nos jornais brasileiros e mundiais foi a acusação de assédio sexual de uma funcionária da CBF contra o presidente de instituição, atualmente afastado pelo conselho de ética.

Acusações de assédio sexual aparentam se tornar frequentes, já que algumas celebridades já foram acusadas do mesmo crime, como o jogador Neymar, que foi acusado pela Nike, assim como José Mayer e Marcius Melhem.

O que chama a atenção no caso da CBF é que, ao contrário dos outros citados, uma das práticas de assédio sexual foi gravada, o que gera uma prova significativa do crime. Em muitos outros processos, essa falta de provas leva à improcedência do julgamento.

No presente artigo tratarei como assediador, no masculino, porque a prática mais comum é de homem assediando mulher, mas pode ocorrer também de mulher com homem, entre homossexuais, enfim, o que importa é a prática e não a orientação sexual do assediador e vítima.

Assédio sexual não é só uma prática repugnante em ambiente de trabalho, é crime previsto no artigo 216-A do Código Penal com a seguinte conduta típica:

Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.

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Mas, afinal, como se pode provar o assédio sexual no ambiente de trabalho?

A primeira forma é gravar as tentativas do assediador, seja por vídeo ou áudio. Já que celulares, até os modelos mais baratos, possuem aplicativos de gravação de ligações ou de som ambiente, torna a versão mais segura de prova.

Não é necessário que o assediador tenha conhecimento da gravação, não precisa de autorização para a gravação da voz ou rosto do assediador, o que se encontra pacífico entre os tribunais, com o entendimento de que a gravação sem o consentimento não viola os direitos da intimidade e personalidade, inclusive valendo o mesmo entendimento, a meu ver, para eventuais violações da LGPD, por se tratar a voz e face de dados pessoais sensíveis.

Confirmando o entendimento apresentado, o E. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região acordou da seguinte forma:

DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. PROVA POR MEIO DE GRAVAÇÃO AMBIENTAL. DEFESA DE INTERESSE LEGÍTIMO. LICITUDE. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é assente no entendimento de que a gravação ambiental realizada por iniciativa de um dos interlocutores, ainda que sem conhecimento do outro, nada tem de ilicitude, notadamente quando se destina a documentá-la em caso de negativa e defesa de interesse legítimo. (TRT-5 – RO: 429001220085050015 BA 0042900-12.2008.5.05.0015, Relator: RENATO MÁRIO BORGES SIMÕES, 2ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 17/06/2009)

Outra forma de provar a prática do assédio sexual é o envio de mensagens pelo assediador. Ainda que seja mais comum para situações de assédio moral, valem para situações de assédio sexual.

É comum, principalmente com o volume de relações digitais que mantemos, que haja a troca de mensagens entre o assediador e a vítima em aplicativos de mensagens. Frequentemente o assediador objetiva marcar encontros fora do horário de trabalho, o que são válidas para a comprovação do assédio sexual.

Aqui também não se discute qualquer ofensa aos direitos a intimidade e personalidade, assim como não é caso de violação de sigilo de mensagens, vez que uma das partes interlocutoras é que faz uso da conversa como prova.

Em respeito ao uso de mensagens para prova de assédio cabe para assédio sexual. Sobre o assunto, o TRT10 julgou da seguinte forma:

ASSÉDIO MORAL. CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO. TOMADORA DE SERVIÇOS LOJAS AMERICANAS S.A. No que interessa ao Direito do Trabalho, define-se o assédio moral – ou mobbing – como atitude abusiva, de índole psicológica, que ofende repetidamente a dignidade psíquica do indivíduo, com o intento de eliminá-lo do ambiente laboral ou de diminuí-lo. O dano moral em si – a dor e abalo moral – não é passível de prova. Uma vez provado o fato ensejador do dano moral e a culpa do agente, resta configurada a obrigação de indenizar. No caso concreto, a prova produzida nos autos é categórica no sentido de atestar que o reclamante foi vítima de assédio moral por parte dos prepostos empresariais, pessoas ocupantes de funções de chefia as quais não apenas lançaram desconfiança absolutamente infundada contra o reclamante e outro colega seu, a partir de estereótipos, como também difundiram em rede social utilizada por grupo de empregados da reclamada mensagens difamatórias contra a honra e boa fama dos dois trabalhadores recém-contratados, a ponto de elegê-los como sujeitos desonestos com base em visão totalmente estereotipada do ser humano, reitere-se. Recurso empresarial conhecido e improvido no aspecto do dano moral. (TRT-10 000 14925020195100101 DF, Data de Julgamento: 27/01/2021, Data de Publicação: 02/02/2021)

Por fim, não esgotando o tema a respeito de provas, são somente algumas possibilidades, temos a palavra da vítima como uma prova possível. Evidente que não é a melhor das provas, por precisar de outros indícios da prática, mas é uma possibilidade.

Leia também: O que é o compliance trabalhista?

A palavra da vítima serve como prova?

A palavra da vítima como prova do assédio sexual já há algum tempo dá maior valoração nos crimes de assédio sexual. A respeito, o TJMG decidiu da seguinte forma:

ASSÉDIO SEXUAL – MATERIALIDADE COMPROVADA – PROVA DA AUTORIA – PALAVRA DA VÍTIMA – RELEVÂNCIA – CONFORTO NAS DEMAIS PROVAS E INDÍCIOS COLHIDOS. Nos termos da orientação unânime da jurisprudência, nos crimes contra a dignidade sexual, quase sempre praticado sem a presença de circunstantes, a palavra da ofendida é de amplo valor probatório, notadamente quando corroborada por outros elementos de prova, como no caso dos autos, devendo prevalecer em relação à negativa de autoria do acusado. Recurso não provido. (TJ-MG – APR: 10017050140817001 Almenara, Relator: Judimar Biber, Data de Julgamento: 11/05/2010, Câmaras Criminais Isoladas / 1ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 09/07/2010)

Como informado, é uma herança que temos do direito penal e que vem sendo utilizada nas cortes trabalhistas. Inclusive, o TRT4 decidiu assim:

DANO MORAL. ASSÉDIO SEXUAL. PROVA. A prova acerca da configuração de assédio sexual é uma das mais difíceis de ser produzida, já que envolve uma situação que, em regra, ocorre de forma velada, sem a presença de testemunhas. Por esse motivo, a melhor jurisprudência e doutrina aponta que, nessas hipóteses, há que se atribuir considerável relevância à palavra da vítima, especialmente quando confirmada por outros elementos probatórios, ainda que indiretos. Não há como se exigir a existência de depoimentos de pessoas que presenciaram os fatos, portanto. Caso em que há elementos suficientes a indicar a ocorrência de assédio sexual. (TRT-4 – RO: 00 213165420155040019, Data de Julgamento: 25/04/2018, 1ª Turma)

O presente artigo tem o objetivo de orientação, principalmente na produção probatória anterior a qualquer litígio. Referido conhecimento tem utilização penal ou trabalhista, judicial ou extrajudicial, de modo que assediadores não fiquem impunes pela falta de provas de seus atos repugnantes.

Ressalte-se que não só a vítima deve se preocupar com o assédio sexual. Em outras palavras, a prática influencia diretamente o ambiente de trabalho e o desempenho da equipe. Ademais, a vítima, não raras vezes, adquire alguma doença emocional decorrente do assédio.

Além disso, com o mundo cada vez mais globalizado e conectado, eventuais denúncias de assédio sexual podem causar sérios prejuízos econômicos para a empresa denunciada. Como exemplo, o caso do McDonald’s, que teve queda nas cotações de suas ações. Em razão da queda nas ações, a empresa precisou investir para tentar consertar o dano causado pelas denúncias. Por fim, referido investimento não afasta também a obrigação de indenizar a vítima pelos danos morais suportados.

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