Recentemente, uma notícia tomou destaque que foi sobre a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé para uma trabalhadora que não quis assinar a carteira de trabalho por entender que perde o bolsa família quando acontece assim. Frequentemente tenho atendido empregadores que reclamam que atualmente muitos empregados não querem assinar a CTPS para não perder benefício social.
Aliás, o tema surgiu da dúvida de um leitor. Por certo que, caso você queira propor o tema para os próximos artigos, nos envie sua sugestão por aqui.
E então, o trabalhador pode recusar assinar a carteira ou não?
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Ter carteira assinada exclui do bolsa família?
É certo que ter carteira assinada não é motivo para excluir do recebimento de programas sociais. A saber, em sua maioria, os programas sociais condicionam-se à renda familiar, não à carteira assinada.
Atualmente, em 2025, a renda por pessoa na família precisa ser inferior a R$218,00 mensais. Em outras palavras, o beneficiário receberá caso a renda seja compatível, independente da carteira estar assinada ou não.
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Qual a renda mínima para receber o bolsa família?
Para ilustrar, imagine que uma família tem 7 membros mas somente 1 deles trabalha e recebe 1 salário mínimo (R$1.518,00). Analisando a quantidade de membros da família e a renda percebida, temos que a renda por pessoa, ou renda per capita, é de R$216,86, ou seja, abaixo do valor limite para o programa, logo, a família receberá o benefício.
Por fim, importante lembrar que a família precisa manter atualizado o cadastro único (CadÚnico) para poder receber algum benefício.
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Receber bolsa família trabalhando é crime?
Por certo que a condenação citada no início do artigo é de competência trabalhista e não criminal. Ainda assim, a trabalhadora foi condenada a devolver para a União os valores recebidos indevidamente e ao pagamento de multa por litigância de má-fé em valores que serão repassados para o empregador.
Por outro lado, a trabalhadora também poderá ser condenada na esfera criminal pelo crime de estelionato.. Sobre o assunto, o TRF3 já condenou uma pessoa com o seguinte fundamento:
PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO MAJORADO . ARTIGO 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA. MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO COMPROVADOS. CONTINUIDADE DELITIVA AFASTADA . APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA. – Materialidade, autoria delitiva e elemento subjetivo comprovados. Ficou demonstrada a imputação contida na denúncia de que a acusada recebeu indevidamente o benefício Bolsa Família (no período de fevereiro de 2012 a março de 2014). A ré era beneficiária do Programa Bolsa Família desde o ano de 2008 . Em recadastramento realizado em 18.12.2011, destacou que seu núcleo familiar era composto por seis membros, sendo a única que possuía uma fonte de renda. Porém, de acordo com dados do CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais), seu cônjuge foi contratado pela Prefeitura Municipal de Salto/SP, na data de 08 .02.2012, bem como a apelante mantinha, no período mencionado, vínculo empregatício com a empresa Ômega Alimentação e Serviços Especializados Ltda. Conforme frisado pelas testemunhas em juízo, os beneficiários são orientados quanto à necessidade de informar ao órgão gestor do Programa Bolsa Família sobre a alteração na composição da renda familiar, contudo, além de omitir a informação sobre a renda familiar, a acusada alegou falsamente, durante a visita da assistente social em sua residência (no ano de 2013) que, a despeito de seu marido estar trabalhando, ela estava desempregada. Portanto, restou devidamente comprovado que, ciente da ilicitude de sua conduta, a acusada deixou de informar dados relevantes de alteração da renda familiar, com o claro intuito de manter o recebimento do benefício . Mantida a condenação pela prática do crime do artigo 171, § 3º, do Código Penal – Dosimetria da pena. A pena-base foi computada no mínimo legal, bem como determinou-se a incidência da atenuante da confissão, observando o disposto na Súmula n.º 231 do STJ. Majoração da pena em decorrência da causa de aumento estabelecida pelo § 3º do artigo 171 do Código Penal, eis que o Programa Bolsa Família conta com recursos advindos da União . Pena mantida em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa, cada qual no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente na data dos fatos. Da continuidade delitiva. A despeito do recebimento mensal da prestação, há um único delito perpetrado pelo fraudador, sendo o caso de afastar o reconhecimento do crime continuado – A despeito de a ré ter sido representada pela Defensoria Pública da União, trata-se de pessoa com diploma universitário (nutricionista) que, de acordo com dados do CNIS, contava com salário de R$ 3.462,23, em 04 .2017. Portanto, sem informações atualizadas sobre alteração nos rendimentos da acusada, é o caso de negar o pleito de concessão da gratuidade da justiça. De qualquer sorte, deve ser adotado o entendimento jurisprudencial no sentido de que a eventual impossibilidade de adimplemento das custas processuais deve ser requerida no Juízo da Execução Criminal (Ap. 0000051-59 .2013.8.18.0040, 2ª C . Esp. Crim, Rel. Joaquim Dias de Santana Filho, Julg. 27 .04.2015, v.u.), de modo que nada impede que, oportunamente, o Juízo das Execuções Criminais, observando a insuficiência de recursos do apenado, proceda à suspensão da exigibilidade das custas processuais, pelo período máximo de cinco anos ou enquanto sua situação financeira não lhe permitir arcar com este pagamento . – Apelação da Defesa a que se dá parcial provimento. (TRF-3 – ApCrim: 00013974820184036110 SP, Relator.: FAUSTO MARTIN DE SANCTIS, Data de Julgamento: 26/05/2023, 11ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 29/05/2023)
Portanto, a justiça poderá condenar o trabalhador que recusar assinar a carteira de trabalho para não perder o Bolsa Família a devolver o valor recebido e aplicar as penas previstas para o estelionato (art. 171, §3º, CP). Caso pretenda receber seus direitos trabalhistas judicialmente, a justiça ainda poderá condená-lo ao pagamento de multa por litigância de má-fé.